Coisas de Outras Vidas
Seguiam pela Radial Leste no sentido centro-bairro. Sem que percebessem a via ficou para trás, não havia mais carros e o asfalto virou uma estradinha de terra.
Curiosos, já que nunca tinham visto nada parecido por ali, andaram umas centenas de metros até divisarem uma via transversal de chão batido, cercada por uma velha cerca de arame farpado. À frente, surgiu um portão enferrujado e meio caído. Como que atraído por algo sobrenatural, Eduardo desceu do carro, arrastou o que restara do portão e, sem hesitar, guiou o veículo até uma espécie de pátio. e só parou na entrada de uma enorme caverna, encravada num morro de terra vermelha, sem qualquer vegetação. Os dois se entreolharam, e num assentimento mútuo, seguiram pelos corredores escuros da caverna até acessar um espaço que lembrava uma câmara. Através da iluminação quase nula, observaram num canto, um longo banco de madeira e, sobre ele, uma curiosa figura coberta por um manto negro da cabeça aos pés. Era impossível distinguir seu semblante. Sem vacilar, Alice caminhou até o centro da câmara, que mais se assemelhava a um tumulo, e postou-se debaixo do único feixe de luz que parecia vir de fora. De repente, viu com horror, a ameaçadora criatura se arrastar até ela. Sua forma encarquilhada, que o sombrio manto não conseguia disfarçar, apontou o ossudo dedo na direção de Eduardo. Então, cavernosa e inumana voz saiu daquele ser sem rosto. - Vou destruir tudo o que ele tem, até não lhe restar mais nada. Ainda que aterrorizada, Alice tentou divisar o rosto por baixo do capuz. - O que você quer de nós? - perguntou. A criatura soltou uma gargalhada terrível. - Não é nada com você. É com ele. - reverberou a voz carregada de ódio no silencio aterrador. - Que mal ele lhe fez? - Matou minha mulher e meus filhos, e vou vingá-los. Alice ficou confusa. Nada daquilo era verdade, pensou. A não ser que... Seriam fatos acontecidos em outras vidas? Então, uma força poderosa tomou conta dela. Não sentiu mais medo. Olhou fixamente a criatura, elevou uma das mãos e a fechou em torno do que parecia ser o pescoço do ser cadavérico. Apertou-o com força, e cantou com toda a energia do seu coração: “Com minha Mãe estarei, Na santa gloria um dia, junto da Virgem Maria, No céu, no céu, no céu” . O capuz caiu. Era uma caveira. Despertou, subitamente. Estava sozinha no quarto.
Marisa Costa
Enviado por Marisa Costa em 26/04/2012
Alterado em 26/07/2016 Copyright © 2012. Todos os direitos reservados. Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor. |